Desde então, a população portuguesa cresceu 20% chegando às 10,3 milhões de pessoas, segundo os dados do Censos 2021. E também há mais agregados familiares (4.149.096), muito embora sejam bem mais pequenos, sobretudo, formados agora por uma ou duas pessoas. Neste período, a construção de habitação em Portugal deu o salto, tendo mesmo duplicado a oferta de casas existentes entre 1970 e 2021, de tal forma que passou a haver mais 1,8 milhões de casas do que agregados familiares no país.
E embora continuem a existir problemas de conforto térmico e humidade nas habitações em Portugal, a qualidade das casas melhorou – e muito – nas últimas cinco décadas. “A ausência de eletricidade, água canalizada ou saneamento básicosão questões que se colocam de forma muito pontual, ao contrário do problema generalizado que ainda persistia em meados da década de 1970 e que afetava milhões de portugueses. Do ponto de vista habitacional, vivemos, certamente, muito melhor”, disse Gonçalo Antunes, professor e investigador na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (NOVA FCSH) da Universidade Nova de Lisboa, neste artigo publicado pelo idealista/news há um ano.
Apesar deste aumento do parque habitacional existente, encontrar uma casa para viver continua a ser difícil para os portugueses hoje em dia. Os dados do INE mostram que só há 12% de casas vagas face ao total de apartamentos e moradias existentes. E, destas, menos de metade estão para venda ou arrendamento. As outras casas estão vazias por outros motivos. Perante o elevado número de casas vazias no país, o antigo Executivo socialista de António Costa aprovou o arrendamento coersivo de casas devolutas, uma medida que deverá ser revogada pelo novo Governo da Aliança Democrática liderado por Luís Montenegro, assim como outras medidas do Mais Habitação.
A par de tudo isto, as famílias deparam-se com um mercado habitacional mais competitivo, marcado por uma elevada procura face à oferta, que nos últimos anos tem feito escalar os preços das casas para comprar ou arrendar a ritmo muito superior ao crescimento dos salários. Depois de uma fase marcada por dinheiro barato, baixa inflação e facilidades nos empréstimos para comprar casa, o acesso ao crédito habitação também está agora mais difícil, sobretudo para quem tem baixos salários, uma vez que os juros se mantêm elevados, estando uma descida da Euribor, que impacta diretamente as prestações da casa, à vista apenas para o verão.
Casas de residência principal perdem peso em 50 anos – mas casas de férias ganham
O número de moradias e apartamentos existentes em Portugal mais do que duplicou em 50 anos de democracia: em 2021 – data dos últimos Censos – contabilizaram-se 5.970.677 habitações existentes, mais 120% que os 2.702.215 alojamentos clássicos registados no ano de 1970.
Importa ressalvar que, na altura, a legislação da propriedade horizontal criada em 1955 estava a dar os primeiros passos e o direito à habitação só ficou consagrado na Constituição de 1976, uma herança da Revolução de Abril. Além disso, “a época do 25 de abril marca também uma época de generalização do acesso ao crédito, incentivando-se a aquisição de casas em regime de propriedade horizontal”, recordou Paulo Tormenta Pinto, arquiteto e professor catedrático no ISCTE, ao idealista/news.
Este crescimento do parque habitacional português permitiu, assim, alojar mais famílias, contabilizando-se mais de 4 milhões de habitações ocupadas enquanto residência principal (+84% face a 1970). Mas o aumento mais expressivo é visível nas casas de férias: se em 1970 só existiam 75.570, 50 anos depois passou a haver 15 vezes mais, superando 1 milhão de alojamentos sazonais.
A diferença é também visível analisando o peso das habitações de residência principal face ao total de alojamentos ocupados. Em 2021, só 5 em cada 10 casas correspondiam à primeira habitação (53% das casas ocupadas nesse ano). Esta proporção é bem inferior à registada na década de 70, já que na altura do 25 de Abril quase todas as casas ocupadas eram de residência principal (97%). Já o peso das casas de férias aumentou substancialmente em cinco décadas: em 1970, só 3% dos alojamentos familiares clássicos ocupados diziam respeito a residências secundárias ou de uso sazonal. Mas em 2021 a percentagem de casas de férias aumentou para 21%, ou seja, mais 18 pontos percentuais.
Este aumento das casas de férias ocupadas poderá estar relacionado com a chegada de mais estrangeiros ao país nas últimas décadas (e com maiores rendimentos), incentivados por programas como o vistos gold para investimento imobiliário e o regime de residentes não habituais (RNH), além da cultura, clima e boa qualidade de vida que Portugal oferece. Ambos os programas terminaram, o primeiro em outubro de 2023 com o Mais Habitação e o segundo com o Orçamento de Estado para 2024. E, ao que tudo parece permitir concluir, o fim destes programas já está a ter efeitos no mercado residencial português, em especial na procura de casas de luxo.