12 de Novembro, 2022 Lucas Lopes

Bancos apoiam renegociação de crédito habitação: não querem as casas

Bancos garantem que vão aplicar novas regras no crédito habitação. Mas ainda desconhecem detalhes finais do novo diploma.

O novo diploma que define novas regras na renegociação do crédito habitação obteve luz verde pelo Conselho Ministros na semana passada. E a banca portuguesa garante que vai cumprir esta medida de apoio às famílias que estão a ver as prestações da casa a aumentar, com a subida a pique da Euribor. Até porque os bancos não têm intenção de executar as garantias hipotecárias, em caso de incumprimento. “Ninguém quer ficar com as casas de ninguém”, garantiu Miguel Maya, presidente executivo do BCP.

Em causa está a medida aprovada pelo Governo que define que a renegociação dos créditos habitação, para efeitos de compra de casa própria e permanente, pode ser feita, por exemplo, quando taxa de esforço aumenta, pelo menos, cinco pontos percentuais e supera os 36%, tal como explica o idealista/news neste guia.

E, sobre a aplicação deste diploma na prática, os bancos garantem que vão cumprir com as novas regras de renegociação do crédito habitação para apoiar as famílias. Miguel Maya considera que “a preocupação do Governo não é só legítima como indispensável”. E o administrador do Santander, afirmou que esta é uma “medida importante”, já que “veio definir limites de ativação e aceleração da avaliação dos bancos”. O diploma foi desenhada “no sentido certo”, disse Miguel Belo na conferência Money Conference (organizada pelo Dinheiro Vivo), que decorreu esta quinta-feira, dia 10 de novembro.

Na semana passada, o presidente executivo do BPI, João Pedro Oliveira e Costa, também tinha garantido que o banco iria cumprir o novo diploma que prevê a renegociação dos empréstimos da casa de taxa variável, nos quais o capital em dívida é inferior a 300 mil euros. “Iremos dar resposta com grande sentido de responsabilidade”, disse a durante a apresentação de resultados do BPI até setembro.

Para que a banca consiga pôr em prática as novas regras de renegociação do crédito habitação, Miguel Maya considera que “é da maior importância garantir que os incentivos estão alinhados para que os bancos desempenhem o seu papel”, frisando que há detalhes do diploma que merecem ser “afinados”.

O que saber antes de renegociar o crédito habitação
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Subida dos juros afeta as famílias de forma diferente

subida dos juros vai atingir – mais tarde ou mais cedo – todas as famílias que têm empréstimos habitação de taxa variável. Isto porque, estando indexados à Euribor, as prestações da casa vão subir assim que forem atualizadas trimestral, semestral ou anualmente (dependendo do prazo contratado). E também vai influenciar os créditos habitação novos, já que as famílias vão começar a pagar juros mais altos e, por isso, a sua capacidade de financiamento fica reduzida.

No que diz respeito aos créditos habitação existentes, o impacto da atualização das prestações vai ser diferente consoante o ano de contratualização. Quem está a pagar as prestações da casa há vários anos terá um impacto menor do que quem contratou um empréstimo recentemente. Isto acontece porque em Portugal usa-se no sistema de amortização francês, no qual o peso de juros é maior no início do contrato e vai diminuindo ao longo do tempo.

“As pessoas que compraram casas há mais tempo têm prestações bastante mais baixas”, afirmou o presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD), Paulo Macedo, na mesma conferência, dando nota que haverá “menos problemas nos vulneráveis mais idosos”.

A questão prende-se, sobretudo, com os créditos habitação mais recentes contratados pelos jovens. “Onde poderá haver maior problema é nos [créditos] mais recentes, [pedidos] por pessoas mais jovens”, frisou Paulo Macedo, assumindo que as instituições bancárias terão de analisar se estes agregados “precisam de ser apoiados”. Até porque estes empréstimos da casa mais recentes já foram concedidos tendo em conta os limites de maturidades definidos pelo Banco de Portugal e, muitos estão nos máximos permitidos, dificultando, assim a renegociação do crédito habitação.

Subida de juros no crédito habitação
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  • Quanto poderão subir os juros nos empréstimos da casa?

A subida a pique dos juros nos contratos de crédito habitação de taxa variável acontece devido à subida da Euribor, que, por sua vez, tem respondido aos aumentos das taxas de juro diretoras pelo Banco Central Europeu (aumentaram em 200 pontos base entre julho e outubro) para travar a inflação.

A boa notícia é que, com estas recentes subidas dos juros diretores, grande parte da política monetária acomodatícia dos últimos anos já “foi corrigida”, garantiu administrador do Banco de Portugal, citado pelo ECO. Para Hélder Rosalino, a subida das taxas de juro é “a melhor forma de proteger os rendimentos das famílias” da alta inflação que se faz sentir no espalo europeu.

Quanto às taxas de juros, apesar de reconhecer que estas registaram um aumento elevado, o CEO do Millennium BCP refere que estas “não estão no patamar adequado”. “Tiveram foi um crescimento muito acentuado”, constata.

Também desde Espanha desdramatizam o patamar dos juros nos 2%-4%, não considerando serem taxas altas tendo em conta o dinâmico presente no mercado hipotecário. Até porque, segundo disse numa conferência o secretario general de la Asociación Española de Banca (AEB), Javier Rodríguez Pellitero, os problemas das famílias não derivam principalmente da subida das taxas e do patamar que atingiram. Também a presidente da Associación Hipotecaria Española (AHE), Santos González, assegurou que as taxas de juro a 2% ou até a 4% condizem com um “mercado hipotecário fenomenal e saudável”.

Há questões no diploma de renegociação de crédito habitação a “afinar”

A banca portuguesa garante que vai cumprir a medida de renegociação de crédito habitação anunciada pelo Governo – que tem ainda passar pelo crivo do Presidência da República para entrar em vigor. Mas nota que ainda desconhece detalhes finais do diploma. “Fazer um diploma é útil, mas tem de se ter cuidado com as suas nuances”, disse o presidente executivo da CGD. E Miguel Maya sublinhou que há “detalhes que é muito importante afinar”.

Também o administrador do Santander afirma ainda não conhecer “o decreto-lei nos seus termos finais”, pelo que aguarda pelas linhas e entrelinhas. Por seu turno, o CEO do Banco Montepio, Pedro Leitão, garante que “não deixaremos de dar apoio nem mais, nem a menos um cliente pelo facto de termos algum esclarecimento adicional” sobre o diploma.

“O diabo está sempre nos detalhes e em encontrar um modelo que seja equilibrado”, defendeu Miguel Maya, vincando não conhecer a versão final do diploma. Para o responsável pelo BCP, a maior preocupação é que se coloque “sobre os bancos que mais apoiam a economia os ónus de outros bancos que não estão no crédito à economia”.

“O incentivo certo é garantir que quem precisa efetivamente [de apoio] pode fazê-lo. Mas exatamente quem precisa”, disse Miguel Maya, presidente executivo do BCP.

Há vários pontos do diploma sobre a renegociação de crédito habitação que têm deixado dúvidas na banca portuguesa, como:

  • Taxas de esforço: dúvida paira sobre os créditos que são tidos em conta para o cálculo;
  • Valor dos créditos que são incluídos na renegociação (até 300 mil euros de capital em dívida)
  • Obrigatoriedade de contacto do banco com as famílias;

Sobre o cálculo da taxa de esforço (peso das prestações de créditos sobre o rendimento), o presidente executivo do BCP questiona como se vão resolver os casos em que uma família se endivida no crédito ao consumo e será o banco que concedeu o crédito habitação a renegociar. E, depois, também tem dúvidas sobre os casos em que há dois créditos habitação, um para comprar casa própria e permanente e outro não visado pelo diploma. Pois, aqui, será o banco que concedeu o empréstimo bancário para adquirir habitação permanente que terá de renegociar.

Sobre a obrigatoriedade de contactar as famílias sempre a taxa de esforço estejam acima dos limites estabelecidos, Miguel Maya diz que “é logo esquisito, porque a pessoa devia tentar encontrar ela as soluções e o banco tem de apresentar uma solução”. Na mesma linha, Paulo Macedo também considerou que deveriam ser os clientes a contactar as instituições, ainda que tenha garantido que a CGD irá cumprir a lei.