26 de Agosto, 2021 Lucas Lopes

Governo pondera manter rendas antigas congeladas

Falta pouco mais de um ano para que as rendas habitacionais celebradas antes de 1990 possam vir a sofrer uma atualização. O período de transição para a atualização dos contratos de arrendamento termina em novembro de 2022, depois de já ter sido prorrogado por duas vezes desde que entrou em vigor a nova lei, que ficou conhecida por “Lei Cristas”, dado ter sido criada pela antiga governante do CDS. Com o prazo a aproximar-se do fim, o governo está a estudar novas intervenções nesta matéria, num momento em que prepara o Orçamento do Estado (OE) para 2022.

“Tendo em consideração estes prazos, o governo está a avaliar os diversos cenários de intervenção no âmbito da elaboração do OE 2022”, fez saber a Secretaria de Estado da Habitação, quando questionada pelo Dinheiro Vivo sobre esta matéria, sem adiantar mais pormenores. “O NRAU [Novo Regime do Arrendamento Urbano] prevê um período transitório, atualmente de 10 anos, com regras específicas para a atualização das rendas dos contratos de arrendamento habitacional” anteriores a 1990 e, findo esse prazo, “os contratos podem transitar para o NRAU, sendo certo que a real eficácia apenas se verifica no final de 2022”, adiantou ainda o organismo liderado por Marina Gonçalves.

Caso o governo opte por manter as rendas antigas congeladas – prolongando o período para a atualização dos contratos, até para fazer face aos efeitos negativos da crise pandémica -, irá, mais uma vez, apanhar desprevenidos os proprietários dos imóveis. Isto porque, já no ano passado, o executivo de António Costa alargou até novembro de 2022 esse prazo sem que os senhorios tivessem conhecimento prévio.

O OE de 2020 incluiu um aditamento à lei das rendas, que estipulou que o período de transição do artigo 35.º do NRAU passou a ser de dez anos. A justificação para esta medida prendeu-se com “o impacto que a atualização das rendas nos termos do NRAU pressuporia para um conjunto alargado de famílias, sobretudo tendo em consideração o mercado habitacional atual” e, por isso, era “importante salvaguardar a extensão do regime por mais dois anos, permitindo a execução das políticas públicas de habitação”.

Na altura, esta alteração “foi uma total surpresa” para a Associação Lisbonense de Proprietários, realça a vice-presidente, Iolanda Gávea. A responsável da maior associação nacional de proprietários lembra que “tem havido sucessivas alterações a este prazo” e, nesta fase, “não prevemos de novo” outros prolongamentos.

Recorde-se que a atual lei das rendas estipulava no seu articulado inicial a aplicação de um período de transição de cinco anos, para que antes da atualização dos preços, os proprietários pudessem salvaguardar as condições de habitabilidade dos imóveis e preparar os arrendatários para a mudança. Já em 2017, o governo do PS estendeu para oito anos esse prazo, até novembro de 2020. No ano passado, passou para 10 anos.

“Para já, não tivemos indicação” que vá haver novas mexidas, diz Iolanda Gávea, frisando que os contratos de arrendamento habitacional anteriores a 1990 estão “longe do valor de uma renda livre”, com as inerentes consequências para os senhorios. O NRAU está em vigor desde 2012.

Os beneficiários deste regime transitório de atualização das rendas de habitação anteriores a 1990 são os inquilinos que comprovem que o rendimento anual bruto corrigido (RABC) do agregado familiar é inferior a cinco retribuições mínimas nacionais anuais (RMNA), explica Iolanda Gávea. Como está estipulado agora na lei, “caso o arrendatário invoque e comprove que o RABC do seu agregado familiar é inferior a cinco RMNA, o contrato só fica submetido ao NRAU mediante acordo entre as partes ou, na falta deste, no prazo de 10 anos a contar da receção, pelo senhorio, da resposta do arrendatário”. Ou seja, só pessoas que provem carência económica é que podem aceder a esta prorrogação.

3000 pedidos
A contas deste ano, “o inquilino é considerado carente economicamente quando aufere um rendimento até 3325 euros/mês”, diz a vice-presidente da ALP. Iolanda Gávea revela que entre os associados da ALP existem 700 arrendatários com contratos de arrendamento de casas anteriores a 1990, que beneficiam deste regime transitório. A título de referência e segundo dados facultados pela Autoridade Tributária e Aduaneira, em 2020, foram emitidas 3073 declarações a certificar que o RABC era inferior a cinco RMNA.

Findo este período de 10 anos, o NRAU prevê que as rendas destes contratos possam ser atualizadas por negociação com o senhorio ou com base em 1/15 do valor patrimonial fiscal do imóvel. Diz também que no silêncio ou inexistência de acordo das partes, o contrato considera-se celebrado com prazo certo, por um período de cinco anos. Recorde-se ainda que a lei previa que os arrendatários com carência económica comprovada pudessem aceder a um subsídio para cobrir a diferença entre a nova renda e o valor que os inquilinos pudessem pagar de acordo com os seus rendimentos, mas dados os prolongamentos do período de transição essa medida nunca foi posta em prática.

 

Fonte: Dinheiro Vivo