4 de Agosto, 2020 Lucas Lopes

Ostras, o superalimento que está de volta ao Sado

É um produto gourmet apreciado sobretudo ao natural com um pouco de sumo de limão. As ostras têm fama de raras e afrodisíacas, mas são ainda mais ricas do que isso. Célia Rodrigues dedica-se à produção de ostras há cerca de dez anos e é tida como uma especialista nestes bivalves. Uma espécie de enciclopédia no que a este produto diz respeito. E nós fomos conhecer a sua produção e saber um pouco mais sobre este regresso ‘das profundezas’ das ostras de Setúbal.

Ostras de volta ao Sado

 

Ponto de encontro: Gâmbia, Setúbal. Surge um carro da empresa de Célia Rodrigues que pede para o seguirmos. Afinal, a produção não está sinalizada no GPS na extensa Reserva Natural do Estuário do Sado. A chegada ao local de produção é de tão difícil acesso quanto o acesso a uma ostra. Foram precisos uns 15 minutos a andar de carro por cima de terra arenosa e ligeiramente enlameada, em primeira ou segunda, para finalmente chegarmos ao habitat destas pequenas e tímidas preciosidades. Mas lá chegámos.

O silêncio é maravilhoso, apenas rasgado pelo chilrear dos pássaros, o voo de uma abelha ou pela voz de quem está na produção. Este é o ambiente onde crescem as ostras de Célia Rodrigues e que lhe valeu, em 2017, o prémio Produtor Artesanal do Ano, atribuído pela ‘Revista de Vinhos’, de entre 3500 produtos a concurso. (Veja imagens da produção na galeria acima).

Célia Rodrigues tem 45 anos e 22 dedicados à aquacultura. Os últimos dez dedicados à aquacultura integrada.  «Mudei-me para Setúbal porque tinha vontade de trabalhar com ostras e especialmente recuperar as ostras em Setúbal e a ostra portuguesa que estava um pouco esquecida, que é a crassostrea angulata. Hoje em dia, de uma forma geral, já estamos todos sensibilizados para a mais-valia que é ter uma espécie autóctone da Península Ibérica, que estava esquecida e a entrar em extinção», explica Célia Rodrigues.

Célia produz a espécie portuguesa (vendida no inverno) e a asiática giga triploide, que por ser estéril e não se reproduzir pode ser vendida o ano inteiro. «É muito interessante trabalhar com uma ostra triploide, porque não se reproduz de maio a setembro e por isso nunca está leitosa. Porque as ostras entre maio e setembro – os meses sem R – ficam leitosas e um bocado desagradáveis e ate ásperas na boca. Mas podem-se comer as triploides porque não se reproduzem. Induz-se o triploidismo através de vários métodos físico-químicos que nada têm a ver com Organismos Geneticamente Modificados», esclarece a empresária.

As ostras estão a ser produzidas num viveiro de dois hectares. Lá cabem 500 mil ostras nas suas diversas fases de evolução. Ali bem perto, mais dois viveiros – um de seis e outro de quarenta – aguardam as licenças necessárias para Célia Rodrigues aumentar a produção. No final de 2018, quer chegar aos dois milhões de ostras.

A empresária defende que uma empresa deve assegurar sustentabilidade económica, social e ambiental. «Aborreci-me um bocado com a piscicultura. Apendi muito e depois de aprender muito sobre os sistemas intensivos e sobre como se dominam os ciclos reprodutivos dos peixes resolvi mudar e passar para a aquacultura integrada, que tem a ver com a produção em esteiro – pré engorda e engorda – de diferentes peixes no mesmo género de habitat. O que faço aqui é aproveitar as antigas pisciculturas abandonadas para produzir ostras e não deixar espaços ao abandono», explica a empresária.

Em Setúbal, existem atualmente cerca de dez produtores de ostras. E não é por acaso. Terra de ostras, elas despareceram em 1968 devido à poluição das águas por metais pesados e também devido à morta massiça em toda a Europa. Estes bivalves desapareceram das águas e das mesas dos setubalenses durante cerca de 40 anos. Estão agora de volta.

«Estamos em plena Reserva Natural do Estuário do Sado, que é um sítio muito particular porque também tem muita influência de água doce que é ótimo para as ostras. Tem menos sal do que o mar. A ostra plana prefere águas límpidas, mais oceânicas. Mas a crassostrea prefere águas com mais matéria orgânica. Vive na lama. Então, um sapal é um sistema riquíssimo porque é aqui que os peixes vêm pôr as crias porque são sítios protegidos. Estas plantas todas aqui à volta são na sua maior parte comestíveis – é uma riqueza imensa que temos para trabalhar. Há camarão, caranguejo, peixes pequenos. A particularidade para as ostras é que, com as marés, o rio arrasta matéria orgânica e lama. A matéria orgânica é a base de alimentação do fitoplâncton e este é o alimento das ostras», explica a especialista.

 

Fonte: mood