O mercado imobiliário cresceu duas vezes e meia nos últimos quatro anos, chegando às 46 mil transações no segundo trimestre de 2018, mas está a contribuir para o agravamento das desigualdades sociais. Esta é uma das conclusões do 4º relatório do Observatório sobre as Crises e as Alternativas, que foi divulgado esta terça-feira (22 de janeiro de 2019) e que tem como tema “A nova questão da habitação em Portugal: uma abordagem de economia política”.
Segundo a coordenadora do estudo, Ana Santos, o mercado imobiliário “está a atravessar um momento sem precedentes históricos, com os preços da habitação a crescerem ininterruptamente e substancialmente acima da evolução salarial, tornando a habitação cada vez menos acessível a camadas cada vez mais significativas da população”.
O estudo em causa resulta da pesquisa realizada por investigadores do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra e do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território (IGOT) da Universidade de Lisboa.
Citada pela Lusa, que teve acesso ao estudo, a investigadora disse que a “habitação financeirizada” tem-se transformado “num mecanismo cada vez mais determinante de reprodução de desigualdades sociais, resultado do reforço do peso económico e político do imobiliário”.
Para Ana Santos, a nova Lei do Arrendamento Urbano, aprovada em agosto de 2012, contribuiu para que a venda de casas aumentasse: “Ainda que o objetivo explicitado fosse o estímulo ao arrendamento urbano, o resultado, no entanto, tem sido a aceleração do termo dos contratos de arrendamento, com vista a venda dos imóveis ou novos usos, como o Alojamento Local (AL)”.
A “habitação financeirizada” tem-se transformado “num mecanismo cada vez mais determinante de reprodução de desigualdades sociais, resultado do reforço do peso económico e político do imobiliário”, conclui o estudo
Segundo a investigadora, desde 2014 que se regista um crescimento acelerado do número de transações, na sua grande maioria de apartamentos existentes, tendo-se multiplicado por duas vezes e meia em apenas quatro anos, chegando às 46 mil transações no segundo trimestre de 2018, ao mesmo tempo que o número de apartamentos registados como AL se multiplicou por cinco, chegando aos 14,5 mil apartamentos.
O contributo dos investidores estrangeiros
O Regime de Autorização de Residência para Atividade de Investimento (ARI) – os chamados vistos gold – não foi esquecido no estudo. “Entre outubro de 2012 e 30 setembro de 2018, das 6.562 autorizações de residência concedidas, 95% foram obtidas por via do requisito da aquisição de bens imóveis”, afirmou Ana Santos.
A responsável adiantou que os vistos gold, à semelhança do regime fiscal para o residente não habitual têm contribuído para que, desde 2014, os preços da habitação tenham crescido continuamente em Portugal, em especial em Lisboa, Porto e na região do Algarve.
Preços das casas aumentaram 34% desde 2014
Segundo o estudo, entre o primeiro trimestre de 2014 e o segundo trimestre de 2018 os preços da habitação aumentaram 34% (em termos nominais).
“Esta evolução dos preços da habitação face aos rendimentos da população portuguesa faz com que a habitação se torne cada vez menos acessível nos locais de maior pressão, substituindo proprietários nacionais por proprietários de economias mais avançadas ou com maior poder económico, e residentes habituais por residentes ausentes boa parte do ano e visitantes ocasionais, provocando não só profundas transformações nas vidas das pessoas que são forçadas a refazer as suas vidas noutros espaços, como levando à descaracterização dos lugares com resultados ainda incertos”, concluiu Ana Santos.
Fonte: Idealista